“Dá um pouco menos de três hectares. São dois hectares e um pouquinho onde eu planto café”. É nesta área que José Sebastião de Oliveira, produtor de Xapuri, conquistou o latifúndio de 89,5 pontos no Quali Café 2025. A propriedade inteira tem 16 hectares. Dedicada ao café, menos de três hectares. Isso diz muito sobre o Acre.
É bom lembrar o seguinte: José Sebastião não tem acesso a equipamentos ultramodernos. Não faz viagens internacionais e ouve dicas dos agrônomos da moda. Ele não pega o celular e liga para o pesquisador da Embrapa de Rondônia (onde foi desenvolvida e amadurecida a cultivar Robusta) para tirar dúvidas com os cientistas a torto e a direito. José Sebastião luta com as armas que dispõe: Seagri, Sebrae, Senar, Prefeitura de Xapuri e, certamente, fé. Muita fé.
Em um universo de 39 participantes do Quali Café 2025, a vitória de José Sebastião é simbólica de uma cafeicultura de base familiar. É preciso observar os 89,5 pontos como uma conquista que extrai da planta o que ela pode oferecer de mais especial. Aos poucos, também na cafeicultura acreana, vai-se descobrindo o valor de ser pequeno.
O problema da escala não pode ser jamais ignorado. Produzir em volume que satisfaça as demandas do mercado é obviamente importante e não pode ser negligenciado. Mas o que o Acre parece ter nascido com vocação é para buscar nas mínimas coisas aquilo que elas trazem de especial. Fazer um café único, exclusivo. Eis o desafio. A possibilidade de agregar valor está aí. E é preciso vigilância porque não estamos só nessa busca.

A comunidade da Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondônia, acaba de conquistar um feito histórico. Por meio do projeto Tribos, da linha Rituais 85+, da 3 Corações, chegou-se ao café perfeito, com pontuação 100, de acordo com o que exige o protocolo Fine Robusta Cupping Form.
A linha Rituais busca valorizar o protagonismo das comunidades indígenas com processo produtivo sustentável. A comunidade da aldeia Sete de Setembro foi a vencedora da 6ª edição do Concurso Tribos. Os jurados são os mais rigorosos da atualidade.
O terroir da aldeia ofereceu notas sensoriais que, segundo os jurados, sugerem flor de laranjeira, mel, aroma vinhoso, rapadura levemente achocolatada, própolis, hibisco, com acidez média e com o corpo delicado. O Projeto Tribos impactou a produção de 28 aldeias de Rondônia e já movimentou 520 mil quilos de robustas.
Por que o processo produtivo da comunidade indígena da aldeia Sete de Setembro de Rondônia é lembrado? É lembrado para que se perceba que onde se planta café com preocupação de escala também é possível ter produtos refinados, para xícaras muito especiais, com condições de pagar para provar.
Se o critério for volume, atualmente, o Acre não tem como competir nem com Rondônia e seus 2,54 milhões de sacas de café conilon produzidas ano passado. Os números consolidados do Ministério da Indústria de 2024 também mostram que Rondônia exportou mais de 35 mil toneladas de café.
São números grandiosos, muito adiante da realidade acreana. Mas o que é preciso enxergar é que esses números superlativos se apequenam diante da lição que o produtor José Sebastião apresenta. O valor de ser pequeno precisa ser compreendido por aqui. E se os representantes da Agricultura acreana insistirem em não entender o valor dos cafés especiais e quiserem teimar em priorizar a escala como meta de produção, não há problema. Há áreas degradadas em quantidade suficiente para que a cultura do café seja ampliada. Há produtores com capital e ousadia suficientes para investir?