Parte das áreas degradadas da Reserva Chico Mendes está sendo transformada em pequenos cafezais. As plantações são produtos de mão de obra familiar: núcleos de produção com baixo capital instalado, restrições por se tratar de uma área de preservação e distantes de grandes centros consumidores. O que poderia ser um entrave ao crescimento serviu de insumo para o casal Keyti Keti e Jorge Souza.
Eles investiram na ideia em 2020, durante a pandemia, quando decidiram sair de Rio Branco e voltar às raízes familiares: o Seringal Guanabara, Colocação Palmeiras. Fugindo das restrições sanitárias e do ambiente de medo por causa da doença, impuseram-se o desafio de tornar o lugar onde pais e avós moraram e até lutaram para criar, em um ambiente mais produtivo.
Inicialmente, a ideia de plantar café foi de Jorge Souza. Fazer com que o protagonismo passasse a ser feminino foi em uma das diversas reuniões com equipes do Governo do Acre (da Secretaria de Estado de Agricultura) e do ICMBio. Havia 11 famílias presentes à reunião. Dessas, 6 passaram a fazer parte de um projeto piloto. Cada núcleo familiar teria apoio para suar e manejar suas raízes em dois hectares de terra. E o combinado era que as mulheres conduziram os processos decisórios. “Começamos a pensar numa rede de mulheres”, lembra Keti.
A receita tem dado certo. É claro que os companheiros e irmãos, cunhados, primos, todos entram na rotina de trabalho. Faz parte do dia a dia. A decisão e a fala são coletivas. Mas o protagonismo é, sobretudo, delas. “Eu costumo dizer que o café está trazendo dignidade para as famílias extrativistas nas áreas degradadas”, afirma a produtora. “Antes, se dizia que os extrativistas sobreviviam na floresta. Hoje, não. Hoje, a gente diz que o café, junto com a castanha, com a seringa, gera dignidade”.

A produção é cem por cento artesanal. Eles colhem de forma manual, esticam o pano de colheita no chão e retiram, grão por grão. A “cata” (o processo de escolha de cada fruto) é feita dentro de uma caixa d’água. “Nós começamos a torrar nosso café em um fogão à lenha, dentro de um cilindro”, recorda-se a extrativista-cafeicultora.
Mudança_ Foi percebendo todo esse cenário que Keyti Keti entendeu que estavam maduras as floradas da mudança. “Fui ao Sebrae e disse: ‘Sebrae, eu quero transformar isso em um negócio’”.
A partir disto, além de extrativista e cafeicultora, Keyti Keti passou a ser também empresária. Junto com o marido, criou a marca Raízes da Floresta. Em 2023, logo na primeira safra, participaram da primeira edição do Quali Café. Ficaram em oitavo lugar.
Com café classificado com 84 pontos, tiveram a produção escoada para uma cooperativa de Cacoal, em Rondônia, que levou o suor e a história da comunidade da Resex, onde antes havia uma área degradada, para o mercado norteamericano e chinês.
Em 2024, ficaram em quinto lugar no QualiCafé o que garantiu um sistema de irrigação como premiação. Mas o diploma que se expõe com orgulho é o do concurso Café Produzido por Mãos de Mulheres, promovido pela indústria 3 Corações, de Minas Gerais. No Florada Premiada, o Raízes da Floresta está entre os onze do país com o robustas amazônica.
Legado_ “Isso é um legado dentro da floresta. Nós não estamos desmatando, destruindo. Estamos reutilizando um espaço que já foi utilizado no passado”, ensinou a empresária.