Por que os bancos foram os alvos dos agricultores de base familiar?

A percepção consensual de que “dinheiro tem, mas o trabalhador rural não tem acesso” é fundamentada na rotina do produtor, mas ignora regras ditadas pela autoridade monetária, o Banco Central

Itaan Arruda
Agricultores familiares e lideranças sindicais discutem dificuldades de acesso ao crédito do Plano Safra 2025/2026.

O Plano Safra 2025/2026 para a Agricultura Familiar foi lançado na sede da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Acre (Fetacre) com a presença de sindicalistas, gestores públicos e representantes das instituições financeiras. Banco do Brasil, Banco da Amazônia e Caixa Econômica Federal.

Entre os agricultores de base familiar, era clara a percepção generosa em relação ao Governo Federal. A decisão política de disponibilizar dinheiro é reconhecida. Mas, ao mesmo tempo, a fala de todos os representantes da classe trabalhadora seguia a lógica de que “não adianta o Governo disponibilizar o recurso se os bancos do próprio governo não deixam o agricultor acessar o dinheiro”, como afirmou o presidente do Sindicato dos Extrativistas e Assemelhados de Rio Branco, Josimar Ferreira dos Nascimento, o “Josa”.

Mais contundente ainda foi o presidente da Federação dos Trabalhadores em Agricultura do Acre, Antônio Sergioni, o “Cabeça”. “O Pronaf para custeio não atende ao que o agricultor familiar precisa. O que tem importância é o recurso para investimento e é justamente esse que não temos acesso”, reclamou, antes de anunciar o que considerou uma denúncia. “E tem mais: os bancos fazem ‘venda casada’ e isso é ilegal”.

Sergioni, da Fetacre, reclamou da “burocracia” dos bancos oficiais e disse que só o recurso para investimento traz impacto na produção familiar

O presidente da Fetacre se referia ao fato de que os financiamentos, em muitos casos, exigem um histórico bancário por parte do agricultor. “Se não tiver um financiamento de carro, de moto, alguma coisa assim, a gente não acessa. Não tem jeito”.

O superintendente do Banco do Brasil no Acre, Jamilson Farias, reagiu com números. “O Plano Safra foi lançado no dia primeiro de julho. Faz dois meses. Nesses dois meses, o Banco do Brasil no Acre liberou cinquenta e sete milhões para os produtores”, afirmou. “Desse montante, trinta e oito milhões foram só para os pequenos produtores rurais, os produtores de base familiar”.

O representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Cesário Braga,  reage na defesa do processo. “Tem dificuldade [de acesso aos recursos] porque é dinheiro público. Estamos falando de juros subsidiados. Então, são projetos que precisam ser feitos para que esses agricultores possam acessar esse recurso”, afirmou. “Mas nós estamos fazendo esforço para destravar. Por exemplo: hoje, nós vamos fazer a assinatura de um recurso de custeio para dentro da reserva extrativista Chico Mendes”.

A dificuldade de se entender a “burocracia” do sistema financeiro é alimentada pelo tom político dado pelas próprias lideranças. Quando o Governo Federal massifica a retórica de que o Plano Safra 2025/2026 “é o maior da história” com R$ 516,2 bilhões para a Agricultura Empresarial e R$ 89,2 bilhões para a Agricultura Familiar fica sugerida a ideia de que tem dinheiro saindo por todo canto e acessível a todos, em qualquer lugar e a todo momento.

Não é assim. Qualquer banco que opere no Brasil tem que seguir regras estabelecidas pela maior autoridade monetária do país, que é o Banco Central. Ele é o protetor da moeda corrente. A manutenção das regras do sistema financeiro do país é uma missão do BC. Para atender ao que os sindicalistas e presidentes de federações agrícolas exigem é necessário, antes, mudar o regramento no Banco Central que, atualmente, tem muito mais independência do que quando o presidente Lula dirigiu o país nos outros dois mandatos.

“Tem que anistiar é o produtor rural”, afirmou Luiz Tchê

As duas lideranças que trouxeram um tom mais politizado ao lançamento do Plano Safra 2025/2026 foram o representante do MDA no Acre, Cesário Braga, e o secretário de Estado de Agricultura, Luiz Tchê.

“Não estão falando aí em ‘anistia’. Pois bem, tem que anistiar é o produtor rural, com uma série de problemas, embargos, um monte de dificuldades”, afirmou para a alegria da plateia. E, nesse tom, Tchê até se esqueceu de que é um agente do Executivo. “Quando o governo não atrapalha, vocês são gigantes por natureza”, finalizou para aplauso geral dos agricultores.

Luiz Tchê esqueceu que era governo e soltou o verbo na defesa do agricultor em tom de pré-campanha

O vereador André Kamai (PT) lembrou que a Lei de Diretrizes Orçamentárias do Município de Rio Branco não previa “um quilômetro de beneficiamento de ramais”. O parlamentar disse que até destinou uma emenda para que fosse equacionada essa situação, mas que uma manobra do prefeito Bocalom “derrubou” a proposta. Kamai é autor da proposta de criação do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável.

O representante do MDA era o mais empolgado. Compreendia a percepção dos agricultores, mas estava focado na defesa do plano, fazendo comparações estratégicas. “Nós estamos em um crescimento de setenta e três por cento em relação ao governo anterior na aplicação do Plano Safra”, calculou Cesário Braga. “Quase meio bilhão de reais que estão sendo aplicados aqui no Acre do Plano Safra anterior. A nossa expectativa é tentar chegar aos setecentos milhões de reais aqui na economia do Acre”.

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