Setor pesqueiro apresenta propostas de sustentabilidade para dirigentes da COP30

“Carta de Belém” reforça ações “estruturantes” e “urgentes” que reforçam necessidade de que o poder público observe o setor como estratégico para efetivar uma economia sustentável na região

Itaan Arruda

Os dirigentes do 2º Congresso Internacional de Pesca elaboraram uma carta formal à presidência da COP30. Chamado de “Carta de Belém”, o documento apela para que os gestores públicos observem a aquicultura e a pesca de forma prioritária para associar o fortalecimento da economia com a sustentabilidade ambiental.

A “Carta de Belém” é assinada por 6.680 inscritos do congresso, entre pesquisadores, empresários, aquicultores e pescadores. “A aquicultura e a pesca, além de contribuir de forma crescente para alimentar a população mundial, cuja projeção para 2050 é de 9,8 bilhões de habitantes, tem um grande potencial de redução do impacto sobre o clima e na retomada do caminho do desenvolvimento sustentável”, defende a carta. “Na Amazônia, a produção de pescado é ainda mais relevante e estratégica diante da busca de  soluções que conservem a floresta e gerem postos de trabalho, emprego e renda para os mais de 30 milhões de habitantes que nela residem”.

Os integrantes do 2º Congresso Internacional de Pesca dividem as propostas entre “estruturantes” e “urgentes”. O destaque fica por conta da segunda proposta. “Inclusão da Aquicultura e Pesca no Fundo Clima, como atividade de baixo carbono, visando o acesso à condições diferenciadas de financiamento para impulsionar o seu desenvolvimento”.

Leia a íntegra do documento.

CARTA DE BELÉM

À COP 30

2º International Fish Congress & Fish Expo Amazônia – IFC Amazônia

Belém do Pará, Brasil, abril de 2025

A segunda edição do IFC Amazônia aconteceu entre os dias 23 a 25 de abril de 2025, em Belém do Pará, em conjunto com o Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca, reunindo 6.680 inscritos, incluindo pescadores, aquicultores, pesquisadores, empresários, profissionais e organizações do setor, estudantes, professores, representantes da sociedade civil e tomadores de decisão.

Durante a realização do IFC Amazônia, considerando a relevância econômica e social da pesca e aquicultura para o Brasil e para o mundo, e, a partir dos debates realizados sobre a COP 30 e o papel do setor frente às mudanças climáticas, a organização do congresso, juntamente com as entidades e os participantes do mesmo, decidiram pela elaboração desta carta a ser apresentada à COP 30. O objetivo é destacar as preocupações, mas sobretudo, apontar soluções no âmbito do desenvolvimento sustentável, onde a produção de pescado é apresentada como uma solução sustentável para a segurança alimentar global e como alternativa econômica de grande potencial para o desenvolvimento da Amazônia, assegurando a preservação da floresta.

A aquicultura e a pesca, além de contribuir de forma crescente para alimentar a população mundial, cuja projeção para 2050 é de 9,8 bilhões de habitantes, tem um grande potencial de redução do impacto sobre o clima e na retomada do caminho do desenvolvimento sustentável. A produção de pescado é uma atividade de baixo carbono, tem baixas emissões de gases de efeito estufa, podendo até sequestrar carbono da atmosfera. É também muito eficiente porque apresenta uma excelente conversão alimentar, ou seja, menor quantidade de alimento para a produção de um quilo de proteína.

Na Amazônia, a produção de pescado é ainda mais relevante e estratégica diante da busca de  soluções que conservem a floresta e gerem postos de trabalho, emprego e renda para os mais de 30 milhões de habitantes que nela residem. A Amazônia abriga a maior reserva de água doce superficial do mundo, contém espécies com grande potencial aquícola, clima propício o ano inteiro, alto consumo de pescado e familiaridade com a atividade. A Amazônia tem potencial de transformar-se em um grande polo mundial de produção de pescado, mantendo a integridade da floresta.

É estratégico investir na produção de pescado como fonte de proteína de origem animal saudável e sustentável para a Amazônia e para o planeta. Direcionar políticas públicas e investimentos internacionais no seu desenvolvimento é a forma mais rápida e eficiente de consolidar uma atividade com potencial gigantesco de produção para alimentar a população da Amazônia, do Brasil e exportar para o mundo, contribuindo para o suprimento da crescente demanda de pescado apontada pela FAO.

Nesta carta, com o objetivo de contribuir para o fortalecimento da agenda climática e da economia azul, apresentamos aos membros da COP30, um conjunto de propostas consideradas ESTRUTURANTES e URGENTES para promover o desenvolvimento sustentável da aquicultura e da pesca no Brasil, em especial na Amazônia. Esperamos que nossa contribuição possa orientar políticas públicas e ressaltar a necessidade de investimentos nacionais e internacionais para o desenvolvimento econômico sustentável por meio da produção de pescado. As propostas são:

1. Inclusão da Aquicultura e Pesca como atividade estratégica e estruturante para o  desenvolvimento da região amazônica nas ações de governos, órgãos de fomento e órgãos financiadores, como atividade de baixo carbono, para a produção de alimentos e a geração de  trabalho, emprego e renda e preservação da floresta;

2. Inclusão da Aquicultura e Pesca no Fundo Clima, como atividade de baixo carbono, visando o acesso à condições diferenciadas de financiamento para impulsionar o seu desenvolvimento;

3. Implementação das seguintes ações estruturantes, alicerçadas em um plano estratégico e de longo prazo, para o desenvolvimento da Aquicultura e Pesca na região amazônica:

3.1. Inovação e transferência de tecnologia na cadeia produtiva – É necessário incentivar o desenvolvimento de pesquisa aplicada em todos os elos da cadeia produtiva para atender as demandas atuais e adaptar-se às mudanças ambientais e climáticas, econômicas e sociais, aumentar a eficiência dos sistemas de produção no uso de recursos naturais e tornar a frota pesqueira mais eficiente. É fundamental transmitir o conhecimento gerado às cooperativas, aquicultores e pescadores fortalecendo a Assistência Técnica e Extensão Rural para aumentar a sustentabilidade do setor.

3.2. Formação e capacitação de recursos humanos – O Sistema Educacional Brasileiro forma  atualmente um número adequado de profissionais considerando a demanda do setor produtivo. Faz￾se necessário, porém, melhorar a qualidade da formação profissional, adequando a base curricular às neces

sidades do setor nas diferentes regiões do país e às transformações que o mundo experimenta do ponto de vista tecnológico, econômico, social e ambiental. Formar profissionais comprometidos com modelos de desenvolvimento sustentáveis e capazes de comunicar e difundir conhecimentos deve ser uma grande prioridade, bem como valorizar pescadores e aquicultores, que são os responsáveis pelo desenvolvimento do setor;

3.3. Diagnóstico, ordenamento territorial, gestão e fiscalização dos recursos pesqueiros – O  planejamento estratégico de expansão da aquicultura e da pesca deve basear-se em diagnóstico preciso das duas atividades, seguido por ordenamento territorial de modo a garantir a recuperação e perenidade dos recursos naturais necessários para as respectivas atividades. Esses aspectos devem ser inseridos nos instrumentos jurídicos para implantação de políticas públicas, considerando as características ambientais regionais, os principais mercados consumidores e as rotas de escoamento da produção, de modo a garantir o aumento da sustentabilidade e a redução dos impactos ambientais. Deve-se também, assegurar os recursos necessários para investimentos em pesquisa e monitoramento de estoques, estatística e fiscalização, objetivando viabilizar uma gestão eficiente e sustentável dos recursos pesqueiros;

3.4. A sustentabilidade econômica, social e ambiental deve nortear as estratégias de crescimento da aquicultura e da pesca – Para que o serviço ecossistêmico de provisão de alimentos se mantenha ao longo do tempo deve-se implantar práticas sustentáveis de produção, considerando os aspectos ambientais, econômicos e sociais. Além disso, deve-se incluir a aquicultura e a pesca nas paisagens terrestres e marinhas para alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela ONU como metas a serem atingidas até 2030;

3.5. Aumento do investimento na cadeia produtiva e na divulgação dos produtos da aquicultura e da pesca – Assegurar o acesso ao crédito e a regularização das propriedades é estratégico. Para isso, faz-se necessário que os estados estabeleçam regras de licenciamento ambiental que possibilite ao pequeno aquicultor licenciar-se e, assim, ter acesso ao crédito e a regularização fundiária das propriedades. Ainda, é necessário promover estratégias de marketing e de comunicação da aquicultura e da pesca e seus impactos positivos. Na Amazônia, a criação da marca “Pescado da Amazônia” é estratégica para agregar valor ao produto e para que o Pescado Amazônico chegue aos grandes centros de consumo, tornando-se cada vez mais uma alternativa econômica para a região;

3.6. Fortalecer o associativismo e cooperativismo – Uma das estratégias mais promissoras para viabilizar a produção familiar e ribeirinha é desenvolver a organização em torno do associativismo e cooperativismo como forma de ganhar escala, acessar mercado, facilitar o acesso ao conhecimento, assistência técnica, crédito e adoção de novas tecnologias. As políticas públicas e outros investimentos precisam adotar esta ação como central nos projetos; 3.7. Fomentar uma Indústria forte e competitiva e a permanência do pequeno produtor na  atividade – O desenvolvimento da pesca e aquicultura deve ser realizado considerando o  fortalecimento de todos os elos da cadeia produtiva. Deve contemplar os mercados locais, com a implantação de pequenas unidades de processamento, e os grandes mercados nacionais e internacionais, por meio de uma indústria forte e competitiva. Uma forte política de crédito para custeio e investimento é estratégica, bem como o estímulo à elevação do consumo de pescado no mercado interno e às exportações. Nesta perspectiva, as políticas públicas e os investimentos no setor precisam criar as condições para o desenvolvimento de uma cadeia forte, arranjos produtivos locais eficientes e uma indústria de processamento moderna e competitiva; 

Senhores membros da COP30, estas proposições são URGENTES para estimular o crescimento sustentável da aquicultura e da pesca no Brasil, em especial na Amazônia. A aquicultura com seu potencial restaurativo pode ser integrada à agricultura, de acordo com os princípios da bioeconomia e economia circular, reduzindo o desmatamento nos ambientes naturais e gerando renda para milhares de famílias. De maneira complementar, a pesca pode se beneficiar do grande número de espécies da biodiversidade, passíveis de serem explotadas e do manejo efetivo do ecossistema, reduzindo as pressões nos ambientes aquáticos, gerando alimento e renda.

O Brasil possui mais de 1 milhão de pescadores, 300 mil aquicultores, produz mais de 1 milhão de toneladas de pescado na aquicultura e mais de 750 mil toneladas por meio da pesca extrativista, totalizando aproximadamente 2 milhões de toneladas ao ano. Apesar deste volume expressivo, o país ainda possui um enorme potencial inexplorado no setor. Com planejamento estratégico, é possível expandir a produção de forma ambientalmente responsável, socialmente justa, economicamente viável, e com governança compartilhada entre todos os atores da cadeia produtiva.

Belém, 25 de Abril de 2025

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