O artigo de hoje, analisa o papel do Acre como referência no avanço do JREDD+ no Brasil (contabilização da redução das emissões de gases de efeito estufa nos limites de um território). Vamos explorar, não apenas seus ganhos ambientais e econômicos, mas também suas implicações sociais e produtivas. Em especial, enfatiza-se a importância das organizações comunitárias e cooperativas agroextrativistas na consolidação de um modelo de economia florestal de baixo carbono, que reconhece e remunera aqueles que preservam a floresta e produzem de forma sustentável. Trata-se, portanto, de um convite a repensar a relação entre natureza e desenvolvimento, colocando as populações tradicionais e os serviços ambientais no centro das políticas de Estado e do debate sobre o futuro da Amazônia.
A jornalista Andrea Vialli destacou no Jornal Valor Econômico de 09/10/2025, que os Estados da Amazônia Legal podem gerar uma receita entre US$ 10 bilhões a US$ 20 bilhões até 2030 com créditos de carbono ligados às reduções das emissões do desmatamento e degradação evitados nos seus territórios, dentro do conceito de REDD+ Jurisdicional, ou JREDD+.
Vialli destaca que, até 2026, Acre, Tocantins, Pará e Mato Grosso, os Estados mais avançados nos programas JREDD+, poderiam emitir 100 milhões de créditos gerados a partir de reduções de emissões entre 2023 e 2024 e alcançar uma receita de US$ 1,5 bilhão – o montante supera o total de doações do Fundo Amazônia desde 2008, de US$ 1,4 bilhão.
Conceitos de REDD+ e JREDD+ Jurisdicional
O REDD+ é uma sigla que significa “redução de emissões provenientes do desmatamento e da degradação florestal”. O símbolo “+” representa atividades adicionais relacionadas à gestão sustentável das florestas e à conservação e aumento dos estoques de carbono.
O JREDD+ Juruisdicional, trabalha com a contabilização da redução das emissões de gases de efeito estufa nos limites de um território específico, que pode ser um município, Estado ou país.
Estima-se que100 bilhões de créditos de carbono jurisdicional podem ser gerados, até 2030 pela Amazônia legal. Este valor corresponde entre 1 a 2% das emissões globais de gases de efeito estufa e podem ser compensados pela Amazônia.
O Acre como pioneiro do JREDD+
A articulista destaca que o mecanismo entrou no radar dos Estados amazônicos e, hoje, sete Estados da Amazônia Legal estão em fases distintas de desenho de políticas, sendo que Tocantins, Acre e Pará saíram na frente, com negociações dos créditos de carbono que serão gerados já acertadas.
A reportagem porém, não destaca ou desconhece que O Acre é o pioneirissimo no Brasil por sua avançada legislação ambiental, apoiada pela Lei nº 2.308/2010, que instituiu o Sistema Estadual de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA), conforme consta no Diagnóstico Socioeconômico do Acre 60 anos, elaborado pelo
CEDEPLAR – UFMG, em 2022, financiado pelo executivo estadual, Tribunal de Contas e Assembléia Legislativa.
Portanto, desde 2010, essa legislação já dialogava com os mecanismos internacionais de financiamento climático, antecipando discussões que só se consolidariam globalmente com o mecanismo REDD+, implementado em 2011. Um exemplo disso é o reconhecimento legal do
“sequestro e manutenção de carbono” como serviço ambiental, já previsto no âmbito estadual antes de seu reconhecimento formal na arena internacional.
Graças a essa estrutura institucional inovadora, o Acre aderiu ao programa internacional REDD+ Early Movers (REM), recebendo cerca de US$ 3 milhões pela redução de 47 milhões de toneladas de CO₂ equivalente entre 2010 e 2015. A partir de 2017, em parceria com governos da Alemanha e do Reino Unido, iniciou a segunda fase do programa, com recursos previstos de 37,8 milhões de euros.
O acordo do Acre
No artigo do Valor, em agosto de 2025, foi a vez do Acre firmar um acordo para negociação dos seus créditos de carbono jurisdicionais com o banco Standard Chartered, responsável pela venda dos créditos emitidos por um período de cinco anos. Como o programa de REDD+ jurisdicional do Estado já estava desenhado, ainda em 2012.
A jornalista afirma que: “A experiência serviu de base para o novo momento, onde o Estado traçou a linha base para contabilizar a redução dos índices de desmatamento entre 2023 e 2027 – a meta do governo acreano é uma queda de 50% no desmatamento no período, sendo que 25% de redução já foram alcançados no primeiro ano. Leonardo Carvalho, secretário de Meio Ambiente do Acre, estima um potencial de geração entre 30 milhões e 50 milhões de créditos de carbono até 2030”.
Pelos nossos cálculos, com base nos estudos da jornalista Andrea Vialli, os valores estimados pelo Secretário gerariam de R$ 2,9 a R$ 4 bilhões de reias até 2030. Logicamente esses valor pode mudar, dependendo do preço pago pela quantidade de carbono sequestrada pela preservação das florestas acreanas.
Importante lembrar, que esse volume de recurso que deverá ser destinado à preservação e aos serviços ambientais são majoritariamente a fundo perdido, o que permite ao Estado captar recursos sem comprometer sua capacidade de endividamento. Isso é estratégico para promover um modelo de Desenvolvimento Sustentável, que combine crescimento econômico com inovação, competitividade e mitigação das mudanças climáticas, reduzindo a dependência e protegendo a biodiversidade.
No campo social, essa estratégia deve estar alinhada à redução da pobreza e da desigualdade, dado o impacto das mudanças climáticas na saúde e no mercado de trabalho. Para isso, são essenciais investimentos públicos em infraestrutura sustentável, inclusão social e fortalecimento do capital humano.
As cooperativas agroextrativistas em torno da Cooperacre, como a Coopercafé, Cooperxapuri, Coopasf, Coopaeb e Coopercintra e tantas outras espalhadas pela floresta, já desempenham um papel central na organização produtiva local, conectando pequenos produtores e extrativistas a mercados mais amplos. Com o apoio adequado, essas organizações podem ir além da simples comercialização de produtos florestais: elas têm o potencial de se tornarem agentes estruturantes de serviços ambientais, remunerando e reconhecendo formalmente aqueles que preservam a floresta e promovem práticas sustentáveis de uso do solo.
No entanto, pra que isso aconteça, é fundamental que os recursos do JREDD+ sejam direcionados de forma estruturada e ampla, permitindo:
A profissionalização das cooperativas, com capacitação em governança, gestão financeira e projetos socioambientais;
A remuneração direta aos produtores extrativistas, por meio de pagamentos por serviços ambientais (PSA) que valorizem o manejo sustentável e a conservação do carbono florestal;
A ampliação das capacidades técnicas e logísticas, garantindo maior acesso a mercados de valor agregado e certificações ambientais;
O fortalecimento do capital social e humano, para que a transição para uma economia de baixo carbono seja também um processo de emancipação econômica e cultural das comunidades tradicionais.
Assim, ao se tornarem parceiras estratégicas do Estado no âmbito do JREDD+, as cooperativas não apenas expandem suas atividades produtivas, mas consolidam um novo pacto socioambiental na Amazônia: um pacto onde conservar a floresta se torna, também, uma atividade economicamente reconhecida e politicamente valorizada.
Orlando Sabino escreve às quintas-feiras no ac24horas.

