A indústria cerâmica do Acre vive um momento crítico, resultado de uma combinação de fatores econômicos, logísticos e estruturais. Em entrevista ao ac24agro, Márcio Agiolfi, presidente do Sindicato das Indústrias Cerâmicas do Estado do Acre (SINDICE/AC), apontou a falta de investimento em construção civil como a principal causa do encolhimento do setor. “Nos últimos quatro anos, houve uma retração drástica nos investimentos públicos em obras. Sem o governo como indutor econômico, todo o setor da construção civil sofre — e o setor cerâmico é um dos mais atingidos”, disse.
Segundo ele, a paralisação de programas como o calçamento de vias com tijolos maciços — tecnologia que gera até sete vezes mais empregos que o asfalto — afetou diretamente a produção. “Mesmo sendo mais durável e mantendo 93% dos recursos no estado, o pavimento com tijolo foi abandonado. Não há diálogo para sua retomada”.
Crise de insumo e baixa produtividade
Além disso, o setor enfrenta uma grave escassez de lenha, usada como combustível nos fornos. “Há cerâmicas que estão buscando lenha até em Vista Alegre do Abunã (RO), tamanho é o colapso no fornecimento local”, afirma Agiolfi. Em Rio Branco, apenas cinco madeireiras estão ativas, o que é insuficiente para atender às 13 indústrias cerâmicas em funcionamento. A produção está abaixo de 50% da capacidade, com indústrias paradas e estoques esgotados antes mesmo da chegada do verão amazônico, período de maior demanda.
Estudo técnico revela boas práticas e cobrança injusta
O relatório técnico “Gerenciamento de Resíduos Sólidos na Indústria de Cerâmica”, elaborado pelo Fórum Empresarial de Inovação e Desenvolvimento do Acre, revela que as indústrias cerâmicas de Rio Branco adotam boas práticas ambientais e reaproveitam praticamente todos os resíduos do processo produtivo. Peças com defeito são reincorporadas à argila ou transformadas em concreto. As cinzas vegetais são utilizadas como fertilizantes ou para a produção de argamassas. Apenas os resíduos administrativos (papel, vidro, plásticos) são destinados ao serviço público de coleta.
Apesar disso, as cerâmicas pagam a taxa municipal de coleta de lixo com base na área total dos imóveis, prática considerada inconstitucional e injusta pelo estudo. O documento destaca que a cobrança não diferencia empresas que geram resíduos que demandam coleta pública daquelas que realizam reaproveitamento integral. “Essa prática afronta o artigo 145 da Constituição e o Código Tributário Nacional, ao utilizar base de cálculo idêntica ao IPTU e ignorar a realidade da geração de resíduos”, destaca o relatório.
Perfil do setor cerâmico em Rio Branco
O estudo identificou 15 indústrias de cerâmica vermelha no município, das quais 11 participaram da pesquisa. A produção mensal média gira em torno de milheiros de tijolos por unidade, com uso predominante de fornos tipo Paulistinha, alimentados por lenha e resíduos madeireiros. A maioria armazena a matéria-prima (argila) ao ar livre ou em galpões e realiza a secagem de forma natural e forçada. Cerca de 91% das empresas não realizam análise química da argila, o que pode afetar a qualidade e gerar perdas.
O setor emprega majoritariamente mão de obra local e comercializa 100% da produção dentro do estado. Os resíduos administrativos são coletados pela prefeitura, enquanto os industriais têm destinação interna. O relatório ainda aponta que o IMAC, responsável pelo licenciamento ambiental, reconhece que não há exigência formal de comprovação de destinação de resíduos devido ao reaproveitamento integral praticado pelas empresas.
Recomendações do Fórum
O documento sugere a revisão da base de cálculo da taxa de coleta de lixo para as indústrias cerâmicas, com critérios mais justos e proporcionais à real geração de resíduos. Também recomenda a inclusão das cerâmicas nos planejamentos públicos de infraestrutura e habitação, com estímulo à pavimentação com tijolos maciços.
Outro ponto é a necessidade de apoio técnico e financeiro para que as indústrias adotem práticas como análise de qualidade da argila, controle mais eficiente da produção e aproveitamento de resíduos em larga escala.