“É preciso estrada boa. É preciso respeito”, diz produtor de farinha de Sena Madureira

No ramal esburacado do interior acreano, o produtor Seu Damião enfrenta lama, isolamento e perdas para manter viva a tradição da goma de macaxeira, um dos pilares da culinária regional.

Luiz Eduardo Souza

Na beira do Ramal do Tucumã, em Sena Madureira, a rotina de Seu Damião Ferreira, de 62 anos, começa antes do sol nascer. Há mais de três décadas, ele cultiva macaxeira em uma “colônia” que herdou do pai. A terra fértil e a experiência no manejo garantem colheitas boas, mas o que deveria ser um motivo de comemoração vira dor de cabeça quando chega a hora de escoar a produção.

O carro velho sofre para vencer o atoleiro. Quando chove, Seu Damião precisa esperar dias — às vezes semanas — para conseguir levar a mandioca até a cidade. “A gente tira a mandioca hoje, mas pra transformar em goma boa, tem que ser ligeiro. Se atrasar muito, fermenta errado, perde ponto, amarga”, conta, com as mãos calejadas da lida.

A goma que Seu Damião produz é conhecida entre os fregueses da feira de Sena. “É clarinha, seca, perfeita pra tapioca. Tem gente que vem de Rio Branco só pra levar balde”, diz com orgulho. Além da goma, ele também produz farinha seca, massa fresca e beiju, todos com base na macaxeira da variedade branca, que ele mesmo seleciona e replanta ano após ano.

O maior problema, segundo ele, não é plantar, nem transformar a raiz nos derivados. “O duro é sair daqui”, diz, apontando para o ramal cheio de sulcos, onde já perdeu duas cargas no atoleiro. “Ninguém investe em ramal. Só vem trator em época de eleição. E aí, quem vive da mandioca, do beiju, da goma, tem que se virar.”

A história de Seu Damião é a mesma de centenas de agricultores da região que trabalham com produtos derivados da mandioca, uma das bases da alimentação no Acre. A falta de acesso adequado às comunidades rurais impacta diretamente a qualidade dos produtos e reduz o valor agregado do que é levado à feira.

Mesmo assim, Seu Damião segue firme, ensinando os netos a raspar a mandioca, a ferver o tucupi e a secar a goma no sol. “Enquanto eu tiver força, essa tradição não morre. Mas precisava de estrada boa, precisava de respeito.”

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