Estudo do Projeto Legal no Acre revela realidade de mais de 10 mil moradores

Educação, Cidadania, Saneamento, Saúde e Infraestrutura são áreas de análise de pesquisadores

Trabalho da equipe de Gestão Socioambiental busca resolver os problemas dos moradores irregulares da reserva.

Um levantamento produzido pelo Projeto Legal no Acre, a partir dos dados do Censo Demográfico 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), traça um retrato detalhado das condições de vida na Reserva Extrativista Chico Mendes, maior e mais simbólica unidade de conservação do Acre. O boletim, elaborado pelos pesquisadores Francisco Afonso Nepomuceno e Orlando Sabino da Costa Filho, revela avanços importantes em educação e cidadania, mas também expõe desafios estruturais em saneamento, saúde e infraestrutura.

População: juventude em evidência

A Resex Chico Mendes abriga 10.210 moradores, dos quais 5.618 são homens (55%) e 4.592 mulheres (45%). A faixa etária predominante é a de 20 a 59 anos, com 5.220 pessoas (51%), evidenciando a força de trabalho ativa nas atividades extrativistas e agrícolas. Outros 4.285 moradores (42%) têm entre 0 e 19 anos, indicando uma população jovem expressiva. Apenas 705 pessoas (7%) têm mais de 59 anos, número que sugere o deslocamento de idosos para áreas urbanas em busca de atendimento em saúde.

Educação: jovens alfabetizados, idosos em desvantagem

O estudo mostra que a taxa de alfabetização entre os moradores com 15 anos ou mais alcança 80,02%, com ligeira vantagem das mulheres (82,01%) sobre os homens (78,49%). Entre os jovens de 15 a 19 anos, a taxa chega a 96,19%, reflexo de melhorias no acesso à educação nas últimas décadas. Porém, entre idosos com mais de 64 anos, o índice cai para 33,68%, revelando desigualdades históricas.

Crianças: quase todas registradas

Foram contabilizadas 1.256 crianças de até 5 anos na reserva, e a imensa maioria (98,4%) possui algum tipo de registro de nascimento. O dado revela um avanço expressivo em cidadania, embora ainda reste 0,8% sem registro ou com situação indefinida.

Estrutura domiciliar: famílias numerosas e chefia masculina

A Resex possui 2.945 domicílios ocupados, sendo que 77,8% têm como responsáveis homens. A faixa etária mais comum dos responsáveis é de 40 a 59 anos (37,7%), seguida por 25 a 39 anos (36,2%).

A média é de 3,47 moradores por domicílio, sendo maior em casas chefiadas por mulheres (3,63) do que em casas chefiadas por homens (3,42). Apenas 11,1% dos lares são unipessoais.

Saneamento: dados alarmantes

Os números evidenciam sérias carências em infraestrutura:

• Apenas 51,6% das casas têm água encanada ou nascente canalizada;

• Apenas 5,1% contam com rede de esgoto adequada;

• 94,9% utilizam fossas rudimentares ou lançam dejetos em valas e rios;

• Apenas 1,4% têm coleta oficial de lixo, enquanto 98,6% recorrem à queima, enterramento ou descarte em áreas públicas;

• 32,7% dos domicílios não possuem banheiro ou sanitário.

Mortalidade: efeitos da pandemia

Entre 2019 e 2022, foram registrados 76 óbitos na reserva. A maioria das mortes ocorreu entre homens (67%) e nas faixas etárias de 60 a 74 anos. O período mais crítico foi durante a pandemia de COVID-19, em 2020, quando foram contabilizados 21 óbitos. Também chama atenção a ocorrência de 6 mortes entre crianças de 0 a 4 anos.

Desafios e perspectivas

Criada em 1990, com 970 mil hectares distribuídos em sete municípios acreanos, a Resex Chico Mendes é fruto da luta dos seringueiros liderados por Chico Mendes. Mais de três décadas depois, os dados do Censo revelam que o território segue como referência de resistência, mas enfrenta desafios que comprometem a qualidade de vida de seus habitantes.

Para os pesquisadores do Projeto Legal no Acre, os números apontam a necessidade de políticas públicas urgentes em saneamento, saúde e valorização da juventude extrativista.

“O retrato demográfico da Resex Chico Mendes mostra um território resiliente, mas ainda marcado por déficits estruturais. A continuidade da proteção da floresta depende também da melhoria das condições de vida de seus guardiões”, afirmam Nepomuceno e Costa Filho, autores do boletim.

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