Uma pesquisa recente, realizada pela Embrapa Acre, em lavoura de soja e em um fragmento florestal vizinho, utilizando armadilhas Malaise, procurou prospectar insetos-pragas e seus inimigos naturais nesses dois ambientes. Essas armadilhas funcionam como tendas transparentes que interceptam os insetos em voo, permitindo aos cientistas capturar a diversidade das espécies presentes na área. O objetivo era descobrir quais pragas e inimigos naturais circulam entre a lavoura e a mata, já que ambos os ambientes estão interligados.
Dentre os insetos capturados, chamaram atenção os crisopídeos (Neuroptera: Chrysopidae), conhecidos popularmente por “bichos-lixeiros”. Apesar do tamanho discreto, esses insetos desempenham um papel importante na agricultura: suas formas jovens são predadores naturais de diversas pragas agrícolas. Foram identificados espécimes representantes dos gêneros Gonzaga, Leucochrysa e Ceraeochrysa. No entanto, a espécie Ceraeochrysa cubana chamou a atenção por representar mais de 71% de todos os crisopídeos registrados nas duas áreas amostradas. Essa mesma espécie também já havia sido registrada como a mais abundante em plantio de café Canéfora (Conilon), em estudo realizado pela Embrapa Acre.
A forte presença dessa espécie (C. cubana) revela a sua capacidade de adaptação, tanto em ambientes agrícolas, quanto em áreas naturais, e o seu potencial para uso como espécie-chave em programas de manejo integrado de pragas em plantios de soja. Suas larvas são predadoras vorazes e se alimentam de pulgões, cochonilhas, moscas-brancas, ácaros e até de ovos de lagartas que atacam a cultura. Já os adultos, embora se nutram principalmente de pólen e néctar, desempenham papel essencial na reprodução e dispersão da espécie.
A abundância desses insetos representa um aliado natural no controle das pragas e pode contribuir para minimizar perdas na cultura e evitar prejuízos ao produtor rural. Além disso, o controle biológico desempenhado pelos crisopídeos pode reduzir a necessidade de inseticidas, diminuindo custos de produção do agricultor e contribuindo para a preservação ambiental. Manter áreas de floresta próximas às lavouras também se mostrou estratégico: além de preservar a biodiversidade, esses fragmentos funcionam como refúgios, de onde os inimigos naturais podem migrar para a lavoura quando necessário.
Outro ponto relevante do estudo é o reforço à importância do monitoramento da fauna entomológica. Conhecer quais espécies estão presentes em uma cultura e em seu entorno é fundamental para desenvolver práticas agrícolas mais sustentáveis. Resultados como esse contribuem não apenas para o avanço da ciência, mas também para munir o produtor de informações valiosas para a tomada de decisão.
A pesquisa reforça uma lição importante: a natureza pode ser uma grande parceira da agricultura quando é respeitada. Valorizar inimigos naturais, como os crisopídeos, é um passo rumo a uma produção mais sustentável, que combina produtividade com conservação ambiental. Assim, em meio à paisagem verde das plantações e das matas acreanas, os discretos insetos de olhos cintilantes atuam como verdadeiros guardiões da soja, lembrando que, muitas vezes, os maiores aliados da agricultura estão escondidos em detalhes quase invisíveis.
Rodrigo Souza Santos
Biólogo, doutor em Agronomia (Entomologia Agrícola), pesquisador da Embrapa Acre, Rio Branco, AC