Acreano é destaque na defesa econômica e cultural das florestas

Felipe Storch fez parte da série “Nomes para Ficar de Olho”, do jornal O Estado de S. Paulo. Reportagem mostrou a trajetória do economista que foi para os EUA pesquisar mecanismos de compensação pela conservação

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Felipe Storch levou a vivência dos problemas ambientais do Acre para a prestigiada Faculdade de Economia da Universidade de Yale. (Foto: Acervo Pessoal)

“O céu ficava nublado, mas não era de chuva.” Uma das memórias da infância de Felipe Storch é perder dias de aula por causa das queimadas ao redor de Rio Branco, no Acre, onde morava. Aos 31 anos e com um mestrado em uma das instituições mais respeitadas do mundo, hoje ele busca formas de articular comunidades, Estado e iniciativa privada para o uso sustentável da floresta.

Felipe faz parte da série do Estadão “Nomes para ficar de olho”, que traz perfis em texto e vídeo de jovens que devem ganhar projeção nos cenários nacional e internacional nos próximos anos.

A trajetória do estudante mudou radicalmente em 2010, no segundo ano do ensino médio, quando conheceu o programa Jovens Embaixadores, da Embaixada dos Estados Unidos. Selecionado, teve a chance de conhecer a então primeira-dama, Michelle Obama, uma de suas inspirações.

“Ela trouxe uma fala que levo até hoje: ‘Nunca duvidem dos seus sonhos. Com trabalho árduo e muita dedicação, vocês podem realizá-los’. Eu tinha esse sonho distante de trabalhar, assim como o Chico Mendes (1944-1988), a Marina Silva e outras referências do Acre, na pauta do meio ambiente, conectando isso com política pública e economia, e essa fala da Michelle Obama me impulsionou muito.”

Do intercâmbio no programa Jovens Embaixadores surgiu a oportunidade de cursar o ensino médio nos Estados Unidos, na Phillips Academy, em Massachusetts, por onde passaram dois presidentes — George Bush (1924-2018) e seu filho — e cinco vencedores do Prêmio Nobel.

Depois, aprovado com bolsa integral em oito faculdades americanas, Felipe escolheu a Franklin & Marshall College, na Pensilvânia e optou pelas duas matérias que marcaram seu ensino médio para se graduar: economia e estudos ambientais.

Na graduação, passou a estudar a conexão entre as duas áreas e como elas podem atuar na superação da pobreza de uma região.

Sua tese honorária, a única em uma turma de 80 alunos, foi baseada em uma imersão com extrativistas de Xapuri, no Acre. Ao lado de Nilson Mendes, primo de Chico Mendes, Felipe foi conhecendo as famílias da região para estudar o potencial dos produtos da sociobiodiversidade.

“Foi um aprendizado muito interessante perceber que o que às vezes falta não é o produto, mas uma rede de parceiros, de investimento, para que aqueles produtos consigam alcançar mercados interessantes”, afirma, citando exemplos como a Cooperacre, referência em castanhas, e a Veja, que produz calçados com borracha sustentável da região.

“O desafio é que, enquanto a agricultura convencional tem investimentos na ordem dos bilhões em crédito com acesso a mercados e infraestrutura, a bioeconomia ainda luta por milhares, ou no máximo milhões, em investimentos. O acesso a crédito é crucial, não só para agricultores indígenas, mas também para agricultores familiares, extrativistas e ribeirinhos, para que possam investir em melhores equipamentos e infraestrutura”, afirma. “Assim como a agricultura convencional tem uma estrutura estatal que abre portas para novos negócios, a bioeconomia também precisa desse apoio.”

Foi esse desejo de encontrar formas de mudar a estrutura econômica e superar as limitações de financiamento da filantropia que o levou de volta para a academia, após um período em instituições como o Ministério do Meio Ambiente e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

O economista foi agraciado com uma bolsa do programa Three Cairns para estudar em Yale, uma das faculdades mais prestigiadas do mundo, cuja escola de meio ambiente tem 125 anos de tradição. Na instituição, passou a pesquisar mecanismos de compensação pela conservação.

O contato com lideranças globais reforçou sua visão: é preciso transformar o sistema para que a floresta em pé seja, também, um bom negócio, quebrando o antagonismo entre agro e conservação e fazendo as duas frentes avançarem juntas.

“A gente não precisa colocar floresta e agricultura em conflito. Na verdade, elas fazem parte de um todo e é muito estratégico as duas andarem juntas”, afirma. Ele cita o impacto dos rios voadores provenientes da Amazônia na agricultura brasileira: “Outras agriculturas convencionais em outras partes do mundo, até mesmo nos Estados Unidos, dependem muito da irrigação mecanizada, e isso traz um custo extra”. E aponta também o valor do patrimônio genético das florestas para indústrias como a farmacêutica e o agronegócio.

Um dos modelos elogiados pelo economista é o do Fundo Tropical das Florestas, o TFFF, em que os recursos arrecadados são investidos em projetos que geram desenvolvimento social e econômico nas comunidades, e são devolvidos aos investidores com lucro. O lançamento desse mecanismo está previsto para a COP-30, que acontece em novembro, em Belém. “Espero trabalhar com esse tema justamente de mudanças florestais, ajudando o governo brasileiro como for possível no desenho do TFFF. Esse é o caminho eu espero desenvolver nos próximos meses.”

Membro do Comitê Jovem do Painel Científico para a Amazônia, Felipe quer engajar cada vez mais jovens na construção de políticas climáticas. Seu sonho é ver o país realizar seu potencial, com uma economia que valorize a floresta, os biomas e as próximas gerações.

“Quero contribuir para que o Brasil ocupe um espaço único: o de liderar uma economia moderna e estratégica, capaz de usar seus biomas de forma rentável e sustentável. Isso exige articulação entre governo, setor privado e sociedade civil para criar incentivos à economia da floresta, como já existe para a agricultura convencional”, diz. “E que a gente entenda que isso não é uma disputa política, mas por um futuro mais interessante para todos, em que não se dependa de irrigação cara nem as cidades precisem se planejar a cada três meses para o próximo evento climático extremo.”

(Texto de Matheus Fernandes, extraído do jornal O Estado de S. Paulo) 

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