“Êxodo Acreano”: os 5% mais pobres vivem com R$ 2,60 por dia

Extrema pobreza no Acre acaba revelando desigualdades regionais no país, com concentração de riqueza no Sul e Sudeste

Desigualdade de renda extrema afeta diretamente jovens e famílias no Acre

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc): Rendimento de Todas as Fontes (2024), fornece informações detalhadas sobre rendimentos provenientes de trabalho e outras fontes, como aposentadorias, pensões e programas sociais. Entre os principais indicadores estão a massa de rendimento médio mensal real domiciliar per capita, o rendimento médio real de todas as fontes, o rendimento médio de outras fontes e o Índice de Gini do rendimento médio mensal real domiciliar per capita. Os dados abrangem o Brasil, grandes regiões e unidades da federação.

A PNADC é essencial para compreendermos a dinâmica temporal e espacial das desigualdades econômicas e formular políticas públicas eficazes que contribuam com a mitigação da pobreza.  Nem sempre os números nos trazem boas notícias. Contudo, nos permitem ver um mundo até então invisível, ou negligenciado.

Há muito, nos perguntamos o motivo dos jovens acreanos migrarem para outros estados. Sendo o estado de Santa Catarina, a Meca da juventude acreana. Distante de querer dar uma resposta definitiva sobre a questão, vou analisar os números de uma variável chamada: Rendimento médio mensal real domiciliar per capita (RMeDp). Esta variável pode ser definida como sendo a média do total de rendimentos de todas as fontes recebidas pelos moradores de um domicílio, ajustada pela inflação, dividida pelo número de moradores.

Esta variável nos fornece uma visão do padrão de vida médio e da capacidade econômica dos domicílios, nos ajudando a entender melhor a distribuição de renda e bem-estar em uma sociedade.

Os dados presentes da tabela 01, foram extraídos por mim da PNADc e nos mostram números apavorantes. A variável retratada é Rendimento Médio Mensal Real Domiciliar per capita. Olhe a tabela 01 e faça uma breve análise, antes de ler minhas observações.

Tabela 01. Rendimento médio domiciliar per capita mensal e diário no Brasil, Santa Catarina e o Acre, em termos reais em 2024 dos 5% mais pobres.
Ordenação UF RMeDp – R$ RMeDp Diário – R$
Brasil 154,00 5,13
1º. Santa Catarina 327,00 10,90
26º. Acre 78,00 2,60

Fonte: Extraído pelo autor da PNADc

A tabela 01 destaca uma disparidade significativa no Rendimento Médio Mensal Real Domiciliar per capita (RMeDp) entre o Brasil, Santa Catarina e o Acre, focando nos 5% mais pobres em 2024. Os dados revelam diferenças substanciais que ajudam a explicar os padrões de migração entre os estados.

No Acre, o rendimento mensal médio per capita é de apenas R$ 78,00, o que equivale a um rendimento diário de R$ 2,60. Esses números refletem uma situação econômica de extrema pobreza, pois uma família com 4 pessoas, possui apenas R$ 10,40, para sobreviver!  Agora pense na seguinte situação: retire o rendimento do bolsa família destas pessoas. Como elas ficam?

Por outro lado, Santa Catarina apresenta um cenário muito mais favorável. O rendimento mensal médio per capita é de R$ 327,00, com um rendimento diário de R$ 10,90. Logo, uma família de 4 pessoas, dispõe de R$ 43,60 para se alimentar.

Neste quesito a conclusão é óbvia, os pobres no Acre são mais pobres, e os pobres de Santa Catarina são mais ricos e sem o bolsa família a situação seria muito pior no Acre.

A tabela 02 nos mostra a outra face da moeda, nela tem-se o rendimento médio domiciliar per capita mensal do 1% mais rico. Incluímos São Paulo em função de apresentar o maior valor do rendimento. Convido você repetir o exercício que fez na tabela 01 e em seguida, eu faço minhas análises.

Tabela 02. Rendimento médio domiciliar per capita mensal e diário no Brasil, São Paulo, Santa Catarina e o Acre, em termos reais em 2024 do 1% mais rico.
Ordenação UF RMeDp – R$ RMeDp Diário – R$
Brasil 21.767 725,00
São Paulo 28.379 945,00
Santa Catarina 21.940 731,33
24º Acre 12.639 421,30

Fonte: Extraído pelo autor da PNADc

A tabela 02 evidencia as disparidades significativas entre os rendimentos do 1% mais rico no Acre em comparação com o Brasil, São Paulo e Santa Catarina. No Acre, o rendimento mensal per capita é de R$ 12.639, ou R$ 421,30 por dia.

Em contraste, São Paulo apresenta um rendimento mensal de R$ 28.379, ou R$ 945,00 diários, sendo o mais elevado, refletindo seu papel como centro econômico e financeiro do país. Por sua vez, Santa Catarina, apresenta rendimento de R$ 21.940 mensais, ou R$ 731,33 diários, posiciona-se acima da média nacional, indicando um ambiente próspero. Essa análise revela que os ricos do Acre são mais pobres que a média dos ricos no Brasil.

Contudo, o que mais chama atenção, são os números não observados diretamente na PNADc. No Brasil, a relação entre os rendimentos do 1% mais rico sobre o rendimento dos 5% mais pobre nos mostram números ASSUSTADORES, os mais ricos ganham 141 vezes mais que os mais pobres.

Em Santa Catarina, essa relação é 67,10, enquanto no Acre é 162,04, de forma didático quero dizer isso: para cada R$ 1,00 de rendimentos que os 5% mais pobres possuem, o 1% mais rico, detém R$ 162,04. Esses números mostram que, apesar de Santa Catarina ter uma desigualdade significativa, ela é relativamente bom inferior ao Acre e ao Brasil. Em outras palavras, é melhor ser pobre em Santa Catarina que no Acre.

No Acre, a disparidade é intensa, revelando uma diferença econômica preocupante. Esses dados enfatizam a necessidade de estratégias para reduzir a desigualdade de renda e promover um desenvolvimento mais equitativo.

Agora, em um cenário sem bolsa família, a situação do Acre seria catastrófica, pois a relação entre o 1% mais rico e os 5% mais pobres seria muito maior. Cabe aos que pretendem governar o Acre, ao menos compreenderem a realidade de nosso povo e buscarem conhecer o que os números ocultos nos dizem! 

Talvez assim o êxodo dos acreanos seja reduzido.

(Por Rubicleis G. Silva (Doutor em Economia UFV – pós-doutorado FGV, Professor de Economia da UFAC e Tutor do PET-Economia)

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